in Gallavotti, B. 1997. Segredos da Vida. DoGi. Itália.

Os mistérios da Biologia e da Geologia
STOP AO CANCRO DA MAMA
No fim-de-semana passado, milhares de pessoas, no Reino Unido, encheram-se de esperança com o anúncio do nascimento de uma menina, livre de uma forma hereditária de cancro da mama que atingiu três gerações da família paterna. Os portadores do gene BRCA1 alterado apresentam uma probabilidade de 80% de virem a desenvolver uma forma de cancro da mama responsável por 5% a 10% dos casos totais. Teria ainda uma probabilidade de 60% de vir a ter cancro do ovário. (…) Além disso, os portadores desta mutação têm 50% de hipóteses de a passarem aos seus descendentes. Com a aplicação do DGPI quebrou-se a corrente da transmissão. «Mostrámos que esta técnica pode ser aplicada para parar o ciclo devastador da doença», afirma o médico inglês. A mãe da menina, que assistiu ao desenrolar da doença em todas as mulheres da família do marido, admitiu ao jornal Daily Telegraph que não seria capaz de olhar a filha de frente, caso não tivesse tentado a DGPI.
Apesar do entusiasmo britânico, esta não é uma estreia. (…) Também o Reproductive Genetics Institute, de Chicago, uma autêntica fábrica de fertilização in vitro, apresenta, na sua extensa lista de doenças testadas, a pesquisa do BRCA1 e do BRCA2, outro gene implicado numa forma hereditária de cancro da mama e dos ovários.
E o serviço de genética da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, que desenvolveu o protocolo de aplicação de DGPI em 1999, prepara-se, igualmente, para tentar seleccionar um embrião sem a mutação do BRCA2, recorrendo à colaboração com um centro em Bruxelas para análise genética. A unidade portuguesa já fez mais de 200 ciclos de fertilização in vitro, com vista à aplicação de DGPI, sendo que «os testes mais requisitados são os de triagem da Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF) [conhecida por doença dos pezinhos] ou a doença de Huntington», relata Filipa Carvalho, 39 anos, especialista da Universidade do Porto.
Susana e Humberto começaram por rumar ao Porto, quando Pedro tinha 4 anos. Na altura, para os casos de hemofilia, o processo baseava-se em selecção de sexo. Ou seja, eram escolhidos os embriões femininos, uma vez que, na pior das hipóteses, se trataria de um bebé portador da doença. (…) Foi então que decidiram procurar o Instituto Valenciano de Infertilidade, com uma lista de duas dezenas de doenças triadas, e que, para a hemofilia, se baseava na detecção do gene mutado. Todo o tratamento ficou em €10 500, inteiramente pagos pela ADSE. Quando Alexandre nasceu, Pedro sentiu que a família estava completa: «Finalmente, somos quatro!»
UNS PAGAM, OUTROS NÃO
Portugal é pioneiro na aplicação da DGPI à muito portuguesa doença dos pezinhos. (…) Mesmo assim, ainda há quem arrisque, quem não conheça as opções que a ciência oferece ou quem não tenha os mil euros necessários para a estimulação hormonal exigida num processo de fertilização in vitro.
«Nos casos em que a mulher é a portadora da doença e já apresenta sintomas, o casal não tem qualquer tipo de custos com a estimulação hormonal; quando é o homem o portador, o casal tem de pagar a medicação, pois, neste caso, a mulher não goza de isenção», denuncia o enfermeiro Carlos Figueiras, 56 anos, da Associação Portuguesa de Paramiloidose. As taxas de sucesso são à volta de 25%, o que implica que, «em média, os casais tenham de sujeitar-se a quatro ciclos de fertilização para conseguirem uma gravidez», conta Natália Oliveira, 34 anos, assistente social da Associação. «É comum o embrião doente ter maior vitalidade do que o saudável. Além disso, a própria biopsia do embrião, necessária à análise genética, pode interferir com a sua dinâmica», explica Alberto Barros, 51 anos, director do Serviço de Genética da Faculdade de Medicina do Porto.
Jorge Neto, 40 anos, viu a mãe morrer de paramiloidose e, desde os 18 anos, que sabe ser portador da doença. Nesta altura, decidiu que nunca teria filhos. Num congresso, ouviu falar da possibilidade de fazer uma DGPI e, com a mulher, decidiu candidatar-se. «Tivemos uma sorte extraordinária. Conseguimos uma gravidez à primeira tentativa e agora temos duas filhas lindas, de 3 anos», conta Jorge, que já se sujeitou, com sucesso, a um transplante hepático. «Depois de ter passado pelo processo, orientei mais de 20 casais para o DGPI.»
Ana (nome fictício), de 33 anos, advogada, não teve a mesma sorte. Só descobriu que era portadora da doença quando se manifestaram, na mãe, os primeiros sintomas. Nessa altura, já tinha tido um filho. (…)Mesmo assim, Ana tentou aproximar-se do seu sonho de ter cinco filhos e submeteu-se a um DGPI. «Era um caso perfeito, diziam os médicos, porque sou jovem e fértil», conta. Mas não teve sorte. A implantação dos dois embriões resultou num aborto, difícil de superar. Por agora, virou-se para a adopção. «Conheço muitos doentes com PAF e alguns optam por ser pais de forma natural. As pessoas não vão deixar de ter filhos por causa desta doença.»
Aliás, a aplicação da técnica não é consensual e, de cada vez que se anuncia mais um caso de sucesso, há sempre quem faça ressuscitar o fantasma da eugenia. Países como a Itália ou Alemanha proíbem qualquer forma de aplicação de DGPI. (…)
Para o médico, é importante que a sociedade saiba exactamente o que está em causa. «Há muita desinformação, mas as pessoas devem confiar na comunidade científica.» Susana e Humberto confiaram. E jamais se arrependerão.
Desde Aristóteles até meados do séc. XIX, os biólogos dividiram os seres vivos em dois reinos: Plantae e Animalia. Aristóteles considerou critérios como: unicelularidade ou pluricelularidade, fototrofismo, heterotrofismo, seres com ou sem locomoção. No entanto, esta classificação tinha algumas limitações como o facto das bactérias, euglenas e fungos estarem incluídos no Reino Plantae. Isto porque, há bactérias que não realizam fotossíntese; fungos que não são fotossintéticos e com parede celular de natureza não celulósica; e o facto das euglenas, apesar de fotossintéticas, terem locomoção como se vê no vídeo abaixo.
Sistema de classificação de Whittaker
Este sistema é o que tem encontrado maior receptividade. Desenvolvido em 1969, foi posteriormente modificado, sendo apresentado com essas alterações em 1979. A grande diferença entre estas duas versões refere-se à posição das algas. Inicialmente distribuídas entre os reinos Protista e Plantae, consoante fossem, respectivamente, unicelulares ou pluricelulares, foram colocadas no Reino Protista. No entanto, algumas algas são pluricelulares, apesar da sua simplicidade estrutural. O Reino Protista, por passar a incluir seres multicelulares de baixo grau de diferenciação celular leva muitos autores a sugerirem o nome de Protoctista para este reino.
São três os critérios em que se fundamenta a classificação em cinco reinos:
· Níveis de organização celular – considera o tipo de estrutura celular procariótica ou eucariótica, se há seres eucariontes unicelulares, coloniais ou multicelulares com baixo grau de diferenciação celular e seres multicelulares.
· Tipos de nutrição – processo de obtenção do alimento (autotrofismo, heterotrofismo por ingestão ou absorção).
· Interacções nos ecossistemas – distinguindo os seres produtores dos seres consumidores (macroconsumidores e microconsumidores que ao consumirem a matéria orgânica devolvem ao meio matéria inorgânica – decompositores ou saprófitas como fungos, bactérias, e alguns protistas).
O quadro seguinte refere as principais características dos cinco reinos do sistema de Whittaker modificado (1979).
Sistemas de classificação mais recentes
Sistemas de classificação posteriores vieram propor a criação de grupos superiores ao reino, designados por super-reinos ou domínios. Isto devido à comparação de novos dados, como os moleculares (sequências nucleotídicas, de genes ou de aminoácidos em proteínas), que inferem nas relações evolutivas.
A classificação em três domínios reconhece dois domínios incluindo organismos procariontes e apenas um domínio para os eucariontes. Ao Domínio Bacteria corresponde o Reino Eubacteria, ao Domínio Archaea corresponde o Reino Archaebacteria e ao domínio Eukarya correspondem os Reinos Protista, Fungi, Plantae e Animalia. Os protistas constituem um grupo muito diversificado, existindo sistematas que propõem a divisão deste grupo em vários reinos.
As sequências genéticas indicam que Archaea tem uma combinação de genes semelhantes a Bactéria e a Eukarya, estando mais relacionado com Eukarya do que com Bacteria.
Posso concluir que a classificação de organismos encontra-se num contínuo processo de mudança. É importante perceber que definir as categorias mais elevadas da classificação (domínios e reinos da vida) é um trabalho em progresso. Devemos, contudo, considerar os grupos taxonómicos e árvores filogenéticas "hipóteses" em que são usados dados disponíveis para traçar a árvore da vida.
O reino é a categoria mais abrangente, sendo por isso, a mais heterogénea. Entre estes dois extremos consideram-se o género, a família, a ordem, a classe e o filo (divisão nas plantas). Ao longo da hierarquia vai aumentando o número de organismos incluídos em cada nível, mas diminuindo o grau de parentesco entre eles. Os taxonomistas sentiram necessidade de uma classificação mais rigorosa dentro de determinados níveis, criando categorias intermédias, distinguindo-as com prefixos como super, sub e infra.
Quando consideramos dois seres vivos, eles são tanto mais próximos quanto maior for o número de taxa comuns a que pertencem, isto é, quanto mais restrito for o nível do taxon. Por exemplo nesta imagem o cão e o lobo estão evolutivamente mais próximos pois partilham o mesmo género e, consequentemente, todos os grupos superiores ao género.
Nomenclatura
Numa tentativa de universalizar os nomes atribuídos aos seres vivos, os cientistas procuraram criar uma nomenclatura internacional para a sua designação, estabelecendo regras para a atribuição de nomes científicos aos diferentes grupos taxonómicos.
A língua latina é a utilizada para escrever o nome dos organismos desde a Idade Média, pois é uma língua morta, não sujeita a evolução, mantendo o significado original das palavras.
Inicialmente, no séc. XVII, o botânico inglês John Ray desenvolveu um tipo de nomenclatura polinominal, pouco cómodo. Só mais tarde, através de trabalhos feitos por Lineu estabeleceu-se uma nomenclatura binominal, para designar as espécies, mais simples. As regras de nomenclatura estabelecidas por Lineu foram actualizadas pelas Comissões Internacionais de Nomenclatura.
Regras de nomenclatura binominal
· Cada espécie é designada sempre por duas palavras em latim: a primeira escrita com inicial maiúscula e correspondente ao nome do género ou nome genérico a que a espécie pertence; a segunda escrita com inicial minúscula, designando-se por restritivo especifico ou epíteto especifico, sendo apenas usada quando acompanhada do nome do género;
· A designação dos grupos superiores à espécie é uninominal, escrita com inicial maiúscula e podendo ser em latim ou na língua do utilizador;
· O nome da família obtém-se acrescentando a terminação idae à raiz do nome de um dos géneros desta família, no caso dos animais, ou acrescentando acea, no caso das plantas. Há, no entanto, excepções;
· Para designar uma subespécie, utiliza-se uma nomenclatura trinominal, seguindo-se ao nome da espécie o restritivo ou epíteto subespecífico. Por exemplo: Homo sapiens sapiens;
· Os nomes do género, espécie e subespécie são escritos em latim e normalmente em itálico. No caso dos manuscritos deverão ser sublinhados;
· À frente do nome da espécie deve escrever-se em letra de texto o nome ou a abreviatura do nome do taxonomista que, a partir de 1758, atribuiu o nome científico;
· Pode citar-se também a data da publicação do nome da espécie, sendo essa data colocada a seguir ao nome do autor, separada por uma vírgula.
Os nomes científicos permitem, então, que a Biologia tenha uma linguagem verdadeiramente universal.
Diversidade de critérios de classificação
Sistemas de classificações práticos
As primeiras classificações feitas pelo Homem tinham um carácter prático, que se ajustavam às necessidades específicas de quem as utilizava. Ainda hoje em dia distinguimos os animais domésticos dos animais selvagens, por exemplo. Estes sistemas são designados de sistemas de classificação práticos e, por vezes, carecem de base científica, sendo meros instrumentos de sistematização utilitária.
Sistemas de classificação racionais: Horizontais
Os sistemas que utilizam características morfológicas ou fisiológicas dos seres representam sistemas de classificação racionais, propostos pela primeira vez por Aristóteles (Grécia Antiga).
Estes podem dividir-se em sistemas de classificação artificiais, que se baseavam num reduzido número de características e que existiram desde a Grécia Antiga até ao séc. XVIII. Eram sistemas que formavam grupos muito heterogéneos, pois englobavam organismos que diferem em muitas outras características para além das consideradas. Estes sistemas de classificação artificiais caracterizaram o período pré-lineano das classificações.
Carlos Lineu (1707-1778) pretendia uma classificação que reflectisse relações e afinidades naturais entre os organismos. Apesar de fixista, este naturalista realizou um trabalho muito importante, classificando entre plantas e animais mais de 1400 espécies, no entanto, eram ainda classificações artificiais. Por todo o seu trabalho desenvolvido foi considerado o “pai da taxonomia”.
Com o avanço dos conhecimentos científicos e de novos métodos e instrumentos de observação, os conhecimentos sobre os seres vivos aumentaram exponencialmente, o que conduziu à utilização de um número maior de características no processo de classificação. A classificação passou a integrar um grande nº de dados e a exprimir uma maior afinidade entre os seres, passando a existir sistemas de classificação naturais, que caracterizam o período pós-linenao e pré-darwiniano.
Estas classificações, por não considerarem a evolução dos organismos nem o factor tempo que lhes está associado, são classificações horizontais (carácter estático). Estas também podem ser chamadas de fenéticas, pois são baseadas num grande número de semelhanças ou diferenças fenotípicas entre os organismos.
Sistemas de classificação racionais: verticais
Surgiram no período pós-darwiniano as classificações verticais ou filogenéticas, que consideram o factor tempo. Os seres vivos passaram a ser classificados não apenas de acordo com a sua afinidade estrutural e morfológica, mas também de acordo com a sua história evolutiva. Estudos como a paleontologia, comparação anatómica, Citologia, Bioquímica e Genética dos seres vivos têm contribuído para a identificação de ancestrais comuns, ajudando a esclarecer o percurso evolutivo dos grupos de seres vivos e as suas relações filogenéticas, ou de parentesco. Os fenómenos de convergência ou divergência evolutiva ao longo de uma escala de tempo são traduzidos por árvores filogenéticas, típicas da taxonomia evolutiva clássica. As classificações passaram e reflectir a dinâmica dos grupos ao longo do tempo, e não um carácter estático. Estas são, no entanto, consideradas classificações muito subjectivas, um vez que se baseiam nas interpretações de factos utilizando hipóteses sobre relações de parentesco para estabelecer filogenias, e assim poderá ser impossível chegar a novos consensos.
Para os autores dos sistemas de classificação horizontal, a semelhança estrutural resulta do “plano de criação”, enquanto para os evolucionistas, essa semelhança estrutural é consequência de relações de parentesco, porque os organismos descendem de um ancestral comum.